
Já em 2010, quando fui morar lá, minha visão da cidade e das pessoas se expandiu significativamente. Vivia ao norte de Buenos Aires, em San Isidro, e tomava o trem pela manhã até o Retiro sentada no chão do vagão para bicicletas, em meio a tantas outras pessoas. Depois, descia a Nueve de Julio até a Avda. Independencia, onde trabalhava. Pouco a pouco fui conhecendo as entranhas da cidade, as particularidades de cada bairro, a rotina das pessoas.
Descobri o prazer de compartilhar um mate e quitutes no fim de tarde, fosse sentada em frente ao rio ou na grama urbana; que além do tango existe a música folclórica e as peñas; que um asado de vegetais pode ser tão bom quanto um de carne; que leva tempo entender uma letra de tango e a profundidade do sentimento que ela transmite; e, principalmente, que a Agentina é um país com uma enorme diversidade da qual Buenos Aires é só uma parte!
BUENOS AIRES BAIRRO A BAIRRO
BALVANERA (ABASTO): Seguindo pela Av. Corrientes, chegamos a uma região chamada de Abasto, que na verdade é parte do bairro Balvanera, mas que recebeu este nome devido ao
Mercado Abasto, que funcionou até 1984 e que hoje se tornou um Centro Comercial. Nos arredores do mercado viveram alguns artistas que definiram as formas modernas da música porteña, como Aníbal Troilo, Oswaldo Pugliese e Carlos Gardel. É possível visitar a casa/museu de cada um, assim como a vivenda de Luca Prodan, fundador do SUMO (banda revolucionária do rock argentino que compôs de “Mañana em el Abasto”). Em algumas ruas, a fachada das casas é decorada com letras de tango ou fileteado (arte popular decorativa típica de Buenos Aires). Nesta região também está o Teatro Ciego, com espetáculos que aguçam nossos sentidos, já que são realizados no escuro.
BELGRANO: é difícil acreditar que até meados do século XIX o Rio de La Plata chegava até os pés das chamadas Barrancas de Belgrano. Atualmente, o lugar abriga mais de sessenta espécies vegetais, além de acolher as pessoas que querem sentar na grama para tomar mate, ler, conversar, namorar... Também em Belgrano está o Barrio Chino, que surgiu ao redor da década de 80, onde está um dos templos budistas da cidade e onde encontramos todo tipo de ingredientes exóticos, sejam eles orientais ou não.
BOEDO: Bairro onde está a famosa esquina citada no tango Sur (“San Juan y Boedo antiguo, y todo el cielo...”), que compete com o Abasto como zona mais tangueira da cidade.
MONSERRAT: É a zona mais antiga da cidade. Gostava de ir a pé desde a Plaza de Mayo, onde estão a Casa Rosada, o Cabildo, o Museo del Bicentenario e a Piramide de Mayo (maio sendo tão importante porque foi o mês da revolução da independência, em 1810) até a Plaza Del Congresso, observando ao longo da Avenida de mayo edifícios interessantes, como o Palacio Barolo (construído com inúmeras referências a Dante) e o Palacio Vera, pátios internos e pasajes (galerias), museus (Museu Mundial del Tango, Museu de la ciudad, e Museu Etonografico) , teatros (Liceo e Avenida). De lá também é possível tomar a linha A do metrô, a primeira da América do Sul (1913) e que é como uma viagem no tempo.
LA BOCA: Bairro chamado assim por estar localizado na desembocadura do Riachuelo. Foi o lugar onde muitos imigrantes (principalmente espanhóis e italianos) se instalaram, já que o porto oferecia muitas oportunidades de trabalho. Construíam suas casas de madeira e chapa e usavam as sobras de pintura dos estaleiros para colorir as paredes. Mais tarde chegaram boêmios e artistas, dando ao lugar uma atmosfera particular.
Muita gente me falou que atualmente é um bairro perigoso e é realmente visível a diferença ao sair da região do caminito. Porém, nos fins de semana há atividades culturais, como aulas de tango e shows, fazendo com que mais pessoas circulem e dando um pouco mais de segurança. Desde a Fundación PROA é possível ter uma vista excepcional dos restos do antigo porto (Puente Transbordador) e do novo passeio do Riachuelo. Não muito longe dali está La Bombonera, estádio do Club Atletico Boca Juniors.
Uma das figuras mais importantes do bairro foi Quinquela Martín; foi ele quem, junto com outros moradores, converteu uma rua abandonada em um museu a céu aberto, ao qual chamou “Caminito” em homenagem ao célebre tango, além disso de doar o Museu de Bellas Artes de La Boca ao bairro.
PALERMO: São inúmeros os parques e áreas verdes do bairro, como o Parque Tres de Febrero, o Jardim Botanico, o Jardim Japones, o Hipódromo... Também é possível visitar o Planetário, o Zoológico e o MALBA (Museu de arte Latinoamericano). Só os chamados Bosques de Palermo não são muito recomendáveis... Possui diveros bares e restaurantes, desde os mais baratos até os de cozinha de autor ou internacional (mas às vezes se paga mais caro pela decoração e badalação do lugar que pela qualidade da comida...). A parte do bairro dita Palermo Soho possui diversas lojas de design, enquanto Palermo Hollywood é a zona de estúdios de cine e televisão.
PUERTO MADERO: zona conhecida pela oferta gastronômica, onde antigos galpões foram transformados em centros comerciais e restaurantes. Nunca cheguei a comer lá porque me pareceu um lugar criado para turistas, com preços abusivos e versões caricatas dos pratos locais. Preferia cruzar o rio, admirando a maravilhosa Puente de La mujer ou a Fragata Sarmiento (um dos barcos mais tradicionais da armada argentina) e caminhar pela Costanera Sur degustando um choripan! Lá está a Reserva Ecológica, um espaço de 350 hectares que foram inicialmente aterrados para aumentar a cidade e depois abandonados, levando espécies animais e vegetais a povoar a zona pouco a pouco. Anos depois, a região foi convertida em área protegida e aberta aos visitantes.
RECOLETA: bairro conhecido pelas mansões tradicionais, edifícios de alto nível, butiques internacionais e pelo Cementério de La Recoleta, onde está sepultada Eva Perón. Ao lado do cemitério está a Basilica Nuestra Señora Del Pilar, que conserva muitas obras de arte colonial e possui um pátio delicioso. Cruzando a Av. del Libertador estão a Faculdade de Direito, a Floralis Genérica (escultura móvel cujas pétalas se abrem de dia e se fecham à noite) e o Parque Carlos Thays, com esculturas de artistas importantes. Ainda neste bairro estão o Museo Nacional de Bellas Artes (com obras de diversos artistas latino-americanos), o Palais de Glace e da Biblioteca Nacional.
RETIRO: bairro onde se encontra a estação de trens, sendo uma das portas de entrada e saída da cidade. Perto da estação estão a Torre Monumental, também conhecida como Torre dos Ingleses e a Plaza San Martín (general que lutou pela independência da Argentina e outros países da América espanhola).
SAN NICOLÁS: Paralela à Avda. De Mayo está a Avda. Corrientes, agitada de dia e à noite, cheia de teatros, restaurantes, pizzarias, confeitarias, cafés e é onde está minha sorveteria preferida (Cadore).
SAN TELMO: um dos centros de antiquários mais importantes da América Latina, cheio de galerias e onde aos domingos acontece o mercado das pulgas. Atualmente alberga ateliês e galerias, bares com música ao vivo, museus (Museo de Arte Moderno, Museu Histórico Nacional e Museo Del Cine). Foi neste bairro que Quino colocou a casa de Mafalda (famosa história em quadrinhos) e onde se crê que Buenos Aires teria sido fundada pela primeira vez (onde hoje se encontra o Parque Lezama).
TIGRE: Desde o Retiro é possível tomar um trem em direção ao Tigre (o Tren de La costa é mais caro e turístico, e o outro é o trem que as pessoas geralmente usam). Chegando a esta cidadezinha ao norte de Buenos Aires, é possível passear pela costa do rio e até mesmo tomar um barco para alguma ilha do delta do rio.
TEMAIKEN: É um bioparque que trabalha para proteger a natureza, educando, investigando e conservando espécies e ecossistemas. É uma espécie de zoológico, mas com o objetivo de proteger os animais ao invés de explora-los.. Para mais informação entrar em www.temaiken.org.ar
A mí se me hace cuento que empezó Buenos Aires: la juzgo tan eterna como el agua y el aire". (J. L. Borges)

Dizem que Buenos Aires é uma cidade muito “européia”. Talvez seja pelas inúmeras praças e parques que espalham verde em meio ao asfalto ou pela arquitetura; também tive essa impressão quando fui pela primeira vez, em 2005, para o Congresso de Salud Mental y Derechos Humanos, organizado pelas Madres de Plaza de Mayo. Nesta ocasião, Buenos Aires foi para mim um lugar com gente politizada, tango, bife de chorizo e cerveja em garrafas de um litro.


Martinez (San Isidro)

Retiro

Torre Monumental

San Martín

Recoleta

Recoleta

Recoleta

Nuestra Señora Del Pilar

Facultad de Derecho

Floralis Generica

Biblioteca Nacional Mariano Moreno

Palais de Glace - Salón de Artes Visuales (2011)

Palermo - Bairro de Borges

Planetario